Fonte ibahia - Texto Nelson Cadena
Esse era mais ou menos o visual da Colina Sagrada quando o Imperador
da Àustria, o príncipe Maximiliano de Hadsburgo, visitou a Bahia em
1860 e a convite das autoridades participou da Lavagem do Bonfim.
Católico fervoroso e com firmes convicções racistas o ilustre visitante
reparou na força do sincretismo, na desenvoltura do povo baiano,
impressionou-se com a ginga sensual das mulatas e então carregou as
tintas do preconceito no seu relato de viagem. Definiu a festa como
“Louca Bacanal”.
O Príncipe Maximiliano não fez o percurso a pé, é obvio, mas, seguiu o
préstito do Bonfim numa carruagem puxada por quatro cavalos brancos,
conduzida por dois escravos imponentemente vestidos com sobrecasacas da
cor verde e calçoes de veludo, imaginem o calor, ornamentados de prata;
os negros usavam gravata e luvas, figurino exótico, porém refinado como
convinha a um monarca estrangeiro.
O príncipe reparou nos batuques, no povo extravassando alegria, não
lhe pareceu o comportamento adequado para uma festa religiosa e assim
descreveu no seu diário: “Moças negras alegres, envoltas em gazes
transparentes e lenços de cores berrantes, em meio a um falatório
estridente, nas posições mais confortáveis, sensuais e desleixadas… Todo
esse alvoroço deve parecer blasfêmia, pois nesta festa popular dos
negros, misturavam-se, mais do que o permitido, resquícios do paganismo
na assim chamada romaria”.
No mesmo relato descreveu a manifestação popular como “Louca
Bacanal”, chamou o culto religioso de “o sabá negro das feiticeiras”,
detalhou o interior da igreja como “sala de dança, grande, alegre e
animada” e simplificou a lavagem como um ato de mulheres munidas de
vassouras. Maximiliano teve um choque de cultura com o arregaço das
saias das mulheres, as roupas finas, os decotes, as danças de corpo e
claro a expressiva participação dos negros numa festa de tradição
luzitana, branca; seu olhar ortodoxo em relação às festas católicas não
lhe permitiu aceitar o sincretismo, a “festa pagã”.
O sentimento do Príncipe era também o sentimento da elite baiana; reparem no comentário publicado pelo Jornal da Bahia
em 14/01/1858, ou seja, dois anos antes da visita do ilustre
personagem: “Entre os escândalos que deploramos há muito tempo, e que
várias vezes censuramos, áquele da lavagem do Bonfim ultrapassa a todos;
é uma orgia desordenada, um verdadeiro bacanal dos tempos pagãos”.
Maximiliano de Áustria tinha 28 anos quando visitou a Bahia. E a sua
passagem pelo Brasil antecedeu a sua nomeração como Imperador do México
(1864-67) onde viveu o sonho de uma nova monarquia nas américas.
Sonho desfeito pela revolução comandada por Benito Juarez que prendeu o
Imperador, julgou-o em corte marcial e mandou-0 fuzilar.